Concerto de Ano Novo

Pauta Musical
7 min readDec 30, 2022

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Um brinde ao novo ano nesta edição do programa Pauta Musical. A música de Händel para os Reais Fogos de Artifício e o tradicional estilo vienense das valsas de Strauss, para celebrar a paz e as boas entradas.

Cristo Redentor, no Rio de Janeiro | Foto: Fernando Maia (https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/12/31/reveillon-no-rio-fotos.ghtml)

Nesta nota você tem acesso à playlist completa, excertos do roteiro e links para baixar os arquivos de áudio. Esta edição foi transmitida nos dias 31 de dezembro de 2022 e 1o de janeiro de 2023, às 7h30 e às 22h, respectivamente, na Rádio Câmara FM 96,9, com apresentação de Ana Lucia Andrade.

Bloco 1

Bloco 2

Bloco 3

Bloco 4

ou escute em streaming

Playlist

Music for The Royal Fireworks (Händel)

The English Concert

Trevor Pinnock (regente)

Accelerationen (Strauss II)

Rosen aus dem Süden (Strauss II)

Kaiser-Walzer (Strauss II)

Mantovani and his Orchestra

Mantovani (regente)

An der schönen blauen Donau (Strauss II)

Filarmônica de Viena

Daniel Barenboim (regente)

Roteiro (excertos)

Nada mais popular e dançante para um Concerto de Ano Novo que uma valsa vienense. O mais tradicional concerto do mundo para esta data, o Neujahrskonzert da orquestra Filarmônica de Viena, é realizado todo primeiro dia do ano há décadas e sempre protagonizado pelas valsas da dinastia Strauss. Josef e Johann II são os mais famosos da família de compositores. Posteriormente, o estilo foi reinterpretado por Chopin, Brahms e Ravel. No final do século XVIII / século XIX, a valsa foi muito tocada e muito dançada pela elite da época, nos salões vienenses. Ao redor do mundo, passaram a ser interpretadas com bastante regularidade pelas orquestras mais importantes. Uma valsa é sempre uma escolha elegante! Quando não é um convite à dança, faz bailar o espírito e brindar o ano que renova todas as esperanças de um mundo melhor. Mesmo fora dos salões suntuosos, já faz tempo que o Danúbio Azul ganhou praias, praças e avenidas, fazendo parte da trilha sonora mundial que acolhe o novo tempo e embala os votos de paz. A sagrada e tão sonhada Paz. Em meados do século XVIII, já estabelecido na Inglaterra, o germânico Händel recebeu a encomenda daquela que se tornaria uma das suítes mais conhecidas de seu repertório orquestral e uma das mais importantes obras instrumentais do compositor: os Reais Fogos de Artifício, feita para celebrar o fim da Guerra da Sucessão Austríaca e a assinatura do Tratado de Aix-la-Chapelle, em 1748. Com a extinção da linhagem masculina dos Habsburgo, Maria Teresa sucede o pai e herda a coroa no trono da Áustria, Boemia e Hungria. Os Estados sob seus domínios a reconhecem como sucessora, mas Baviera, Saxônia e Espanha reclamam os territórios dos Habsburgo. Frederico II da Rússia, alegando antigos tratados, declara guerra à Imperatriz e atrai França, Baviera, Saxônia, Espanha e Sardenha. Aliada a potências marítimas, Maria Teresa resiste, ganha o apoio da Inglaterra e de seus súditos húngaros. Ao salvar quase que a totalidade de seus Estados, faz eleger imperador, seu marido, Francisco I. Concluída a paz, formalmente declarada, começam os preparativos para a celebração, e uma enorme estrutura que sustenta um arco triunfal é erguida no Green Park, em Londres. Palco para um magnífico espetáculo de fogos de artifício.

Era desejo de Händel apresentar sua composição como uma abertura, mas a coroa britânica a batizou de Música para os Reais Fogos de Artifício, num claro ato de favorecimento à monarquia. Restringiu a instrumentação musical, para que soasse mais marcial ao toque massivo de sopros e percussão, embora Händel tivesse, depois, incluído as cordas na partitura original.

Muitas celebrações e festivais com música ao ar livre são tradicionais ao redor do mundo. Para algumas produções, semanas ou meses são necessários para cumprir o planejamento. Na Inglaterra, grandes eventos em parques e jardins são seculares. Mesmo nos concertos ao ar livre, também é bom costume evitar ruídos que atrapalhem a concentração dos músicos e que perturbem os ouvintes vizinhos, lembrando sempre de eliminar o som de celulares, o que só vai ajudar a preservar a própria atenção, e a de todos, para o que está em cena. Na semana anterior à apresentação oficial dos Reais Fogos de Artifício, em abril de 1749, ano seguinte à celebração do tratado de paz, houve um ensaio público, contra a vontade de Händel, num proeminente espaço de entretenimento londrino, conhecido como Vauxhall Gardens, onde uma centena de músicos tocou para uma audiência de cerca de doze mil espectadores. Se por um lado isso causou contrariedade, o bloqueamento de ruas e congestionamento de tráfego, também se tornou uma das mais bem sucedidas performances musicais da história.

Ex coralista da Catedral de Canterbury, Trevor David Pinnock estudou cravo e órgão no Royal College of Music, onde ganhou os mais altos prêmios de performance em ambos instrumentos, contrariando um veredicto que lhe foi dado nos tempos estudantis de que, para ele, seria impossível ganhar a vida como cravista. E como cravista, excursionou a Europa em tournée com a renomada Academy of St. Martin in the Fields e debutou no Royal Festival Hall, em 1966, com o Galliard Harpsichord Trio (Trio Galliard), do qual foi co-fundador e que originou a orquestra The English Concert, em 1972. Do cravo ou do órgão, o Maestro Trevor Pinnock regeu esta orquestra especializada nas performances de música barroca e do início do período clássico, com instrumentos de época, por mais de trinta anos, se dedicando posteriormente a projetos musicais por muito tempo em espera. As aparências enganam e nem tudo é perfeito! O que parece fazer este mundo, perfeito! Dentre suas virtudes musicais, Händel também era organista, cravista e violinista, a despeito da carreira jurídica sonhada por seu pai, iniciada e abandonada na universidade de sua cidade natal. Quanto à suíte, valeu o ensaio público! Durante a apresentação oficial, houve falha na exibição pirotécnica e um dos pavilhões da estrutura principal pegou fogo. No mês seguinte, já com a combinação de cordas e sopros providenciada pelo grande compositor, a obra foi apresentada numa instituição para crianças carentes, como parte de um programa de caridade.

Fascinante! Música e dança de salão que cresceu em popularidade no início do século XIX, a valsa logo se tornou um estilo independente, com contato mais estreito entre os parceiros. Com braços entrelaçados ao nível da cintura, passou a ser aceita pela alta sociedade, especialmente a de Viena, no fim do século XVIII. Uma sequência de melodias encantadoras, com introdução formal e coda que remete aos temas anteriores. Em linhas gerais, coda, que significa cauda, é a parte final de uma composição musical ou melodia. Essa forma musical de valsa se consolidou com Johann Strauss, um famoso compositor, regente e violinista, ao lado de Joseph Lanner. Seus três filhos bem herdaram o mesmo talento musical e dois deles compuseram as mais belas e atraentes valsas, sendo Johann Strauss II o mais célebre. Ao que parece, nenhuma outra música tem ultrapassado a popularidade e o arrebatamento de suas valsas inesquecíveis. Pelo encanto, graça e sensualidade das composições, Strauss II é qualificado como o “Rei da Valsa”. Seu primeiro grande sucesso foi Acelerações, composta sob encomenda em 1860 para um baile de técnicos em Viena. Bastante adequada para a ocasião, dizem que ele rabiscou os temas da valsa sobre um cardápio na véspera da apresentação. Fazer dos cardápios, partituras, também era bem típico de Schubert.

Annunzio Paolo Mantovani foi um apresentador e regente veneziano muito popular do gênero orquestra light. Depois da graduação em Londres, formou a própria orquestra, uma das mais populares da Inglaterra na época da Segunda Guerra Mundial, tanto na BBC quanto nas performances ao vivo.

Strauss II compôs centenas de valsas que intimamente passaram a retratar o espírito da capital alegre e que fizeram transbordar o sentimento vienense. Também ele seguiu a carreira musical em oposição ao pai. Teve que estudar violino e composição em segredo e chegou a ser bancário. “Tu também és imperador”… Maior dos elogios para quem teve ideias republicanas na juventude, recebido do Imperador Francisco José.

Uma obra-prima de Johann Strauss II, todos os anos, no dia primeiro de janeiro, o Danúbio Azul integra há anos o programa do Concerto de Ano Novo da orquestra Filarmônica de Viena, realizado pela primeira vez em 1939, num dia 31 de dezembro. O programa é uma celebração de alegria e de esperança, espelhada na música vienense do século XIX e de outros compositores austríacos, como Mozart e Schubert. O concerto é realizado na maior sala do Musikverein e sua transmissão por televisão é vista anualmente por milhões de espectadores em todo o mundo. De tão popular em toda a Europa e recentemente em todo o mundo, com gravações anuais, a procura por bilhetes chega a requerer uma reserva com um ano de antecedência para participação no sorteio de bilhetes futuros. E alguns bilhetes são herdados entre gerações. A partir de 1980, os arranjos de flores que decoram a sala passaram a ser oferecidos pela cidade de Sanremo, Itália. Algumas composições são acompanhadas do Ballet da Ópera Estatal de Viena, ao vivo ou filmado em famosos monumentos da Áustria. Habitualmente são tocadas 12 peças e, tradicionalmente, o concerto finaliza com três encore, ou bis. O primeiro é normalmente uma polka e o segundo é a mais famosa valsa vienense, considerada por muitos como o hino nacional da Áustria: o Danúbio Azul. Nesse momento, os primeiros acordes são interrompidos por calorosos aplausos de reconhecimento do público, a quem maestro e orquestra externam votos de feliz ano novo. Depois da interpretação completa do Danúbio Azul, o concerto encerra com a Marcha Radetzky, de Johann Strauss I, quando o público é convidado a participar sob a batuta do maestro.

O primeiro dia do ano é dia de confraternização universal, que se inicia iluminado sob as luzes dos fogos de artifício lançados de torres, pontes e monumentos, ao som de repertório erudito numa festa popular, o que também torna popular o erudito. Possam os fogos de artifício de Händel iluminar a cada ano as boas entradas de um novo tempo! Um tempo de paz que podemos trazer sempre, inspirados na virtude do viver, na mudança de si próprio (como na “Receita de Ano Novo”, de Carlos Drumond de Andrade), e que o belo Danúbio Azul nos faça girar alegres neste imenso salão da vida, aos ecos de cada gesto sublime que atraia a esperada Paz.

Pauta Musical, um passeio pela magia da música erudita! Uma produção da Musicabile em parceria com a Rádio Câmara — Brasília, Governo Federal. Este projeto é realizado com recursos do Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal, transmitido pela rede legislativa e rádios parceiras em todo o Brasil. Direção e apresentação: Ana Lucia Andrade. Trabalhos técnicos: Ricardo Coelho. Acompanhe, curta e compartilhe! Envie comentários e sugestões pela página oficial da Rádio e página oficial do programa no Facebook. Para ouvir novamente, ou ao vivo pela internet, acesse: radio.camara.leg.br

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Programa temático, educativo e cultural voltado à formação de plateia em música erudita, no ar desde 2008 pela Rádio Câmara em Brasília e 2600 rádios parceiras.

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